Setembro – mês mundial da alfabetização

Profa Evelyn Camponucci Cassillo Rosa

Mestre em Educação

No Brasil, a taxa de analfabetismo passou de 6,8%, em 2018, para 6,6%, em 2019, queda que representa cerca de 200 mil pessoas, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua Educação.

Segundo as metas projetadas pelo PNA (Plano Nacional de Alfabetização), deveríamos alcançar a taxa de analfabetismo de 6,5% em 2015 e zerar esta porcentagem até 2024.

Mas, o que considerar sobre esses números?

Quando falamos sobre as taxas de analfabetismo no país, há vários pontos que devem ser levados em consideração, o primeiro deles é que apesar da queda, continuamos em atraso e ao longo do caminho tivemos uma pandemia que certamente impactou esses números.

Vale ressaltar que a porcentagem de 6,6% significa 11 milhões de analfabetos no país e, dentre esses, devemos nos atentar tanto às questões de desigualdades raciais, em que os dados apontam para uma porcentagem maior de analfabetos pardos e  negros, quanto às desigualdades regionais, onde encontramos uma maior taxa de analfabetismo nas regiões norte e nordeste do país, principalmente na população idosa e provenientes das áreas rurais.

Importante salientar também os modelos antigos de ensino, ainda muito engessados que trabalham a alfabetização de forma fragmentada como sendo grandes responsáveis pelas taxas de analfabetismo, visto que tais formatos não colocam os estudantes no centro do processo de aprendizagem, não permitem desenvolvimento de criatividade, desestimulam e muitas vezes culminam em evasão escolar.

Merece destaque ainda a questão do analfabetismo funcional, tão ou mais importante quanto às taxas de analfabetismo, hoje é um dos grandes desafios encontrados na educação brasileira. Alunos que sabem ler (decodificar a escrita), mas não sabem interpretar ou compreender a mensagem implícita, o que também se deve às aulas conteudistas trabalhadas em grande parte das escolas, que não problematizam, não conduzem os alunos à reflexão, não fazem leituras dialogadas explorando o texto, apenas se preocupam com a leitura de livros paradidáticos (um por bimestre), o resumo do mesmo e perguntas feitas pelo próprio encarte do livro. Esse é um dos muitos exemplos que podemos citar no formato tradicional de ensino que engessa estudantes e os robotiza, à medida que a preocupação é sempre a nota ou a promoção ou reprovação do aluno e não a aprendizagem significativa.

A capacidade de interpretação é extremamente importante e fundamental para quaisquer outras áreas de conhecimento e práticas sociais.

Parafraseando Paulo Freire, a educação liberta as pessoas à medida que desenvolve reflexão e consciência crítica, assim, entendemos a alfabetização como cerne, como porta de entrada não apenas à compreensão da leitura e da escrita, mas para o exercício pleno da cidadania.

Alfabetização é um direito de todos. Ela é responsável por libertar os sujeitos, dar autonomia, acesso e oportunidades tanto pessoais quanto profissionais, desenvolver escrita, leitura, oralidade, crítica, elevar a estima, enfim, corrobora com a formação e desenvolvimento integral do ser, portanto deve abraçar a todos, independente das questões sociais ou geográficas, visto que além de aprendizagem e do exercício da cidadania, falar em alfabetização é falar também do desenvolvimento do país.

Importante apontar expectativas positivas ainda que no cenário que estamos atravessando no momento. Lembrando que, na década de 60, as estatísticas mostravam que 40% da população brasileira era analfabeta, se não houvesse expectativa, consequentemente concentração de esforços, não chegaríamos a 6,6% em 2019!

Certamente, há muito o que avançar, há muito trabalho pela frente e não podemos nos esquecer que a pandemia contribuiu ainda mais com atrasos, lacunas e déficits na aprendizagem dos nossos alunos, contudo, o cenário anterior somado à atual pandemia evidenciou também a necessidade de quebrarmos paradigmas, mudarmos práticas arcaicas, renovar metodologias, posturas, desenvolver competências e habilidades essenciais para atingirmos nossos objetivos tanto no quesito alfabetização, quanto na educação como um todo.

No prefácio do livro “Pedagogia do Oprimido” de Paulo Freire (1987) há uma fala que traz o sentido da alfabetização “aprender a escrever a sua vida como autor e como testemunha de sua história, isto é biografar-se, existenciar-se, historicizar-se”.

Assim, independente do cenário ou circunstância, nossa expectativa e esforços deve ser o de formar autores de sua própria história, livres e críticos.

“Não se aprende, Senhor, na fantasia, sonhando, imaginando ou estudando, senão vendo, tratando e pelejando” (Camões, “Canto x” de Os Lusíadas”)

Não haveria citação mais pertinente e, penso que ela cabe a todos que se preocupam e se dedicam à formação e desenvolvimento de pessoas.

Dados, estatísticas, taxas, números… enquanto eles são tabulados, são os professores que pisam o chão da sala de aula e que, de alguma forma, fazem a diferença na vida da criança, do adolescente, do adulto ou do idoso que está ali com o único objetivo, aprender, evoluir, libertar-se e, bem sabemos, só é possível quando compreendemos que esse processo de evolução não está pronto, mas se constrói à medida que experimentamos, que trocamos, que mediamos, que direcionamos nosso olhar singularmente a cada aluno.

A família é parte fundamental nesse processo, a escola, a sociedade, os amigos… A responsabilidade é de todos, afinal “uma nação se faz com homens e livros”. Concentremos nossos esforços para que TODOS possam ler do parágrafo inicial ao último ponto final.

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